terça-feira, 1 de setembro de 2020

The Wall - A Ópera Rock do Pink Floyd. Parte 1


"Papai voou através do oceano deixando apenas uma memória. Uma foto no álbum de família. Papai, o que você deixou para mim? PAPAI, O QUE VOCÊ DEIXOU PARA TRÁS PARA MIM? No final, era só um tijolo no muro. No final,  eram apenas tijolos no muro."

Assim começa um dos álbuns mais icônicos da história do rock. com o desabafo de um homem de 36 anos que não conheceu o pai. Um homem cujo sucesso começava a deixar marcas negativas em seus relacionamentos pessoais e profissionais, trazendo à tona todos os traumas de um garoto marcado pela guerra direta e indiretamente. Seu avô, um mineiro de 26 anos, morreu na 1ª Guerra Mundial, na França. Seu pai, Eric Fletcher Waters, um comunista que acabou se tornando Tenente do 8º Batalhão dos Fuzileiros Reais, desapareceu na praia de Anzio, Itália na 2ª Guerra Mundial. "Presumidamente morto" era o que estava escrito na carta enviada à sua esposa e seu filho recém nascido. George Roger Waters leva o nome do seu avô e um legado de homens que naõ conheceram suas famílias.

O Tenente Eric Fletcher Waters, sua esposa Mary e seus 2 filhos, John e o bebê Roger
O Tenente Eric Fletcher Waters, sua esposa Mary e seus 2 filhos, John e o bebê Roger

Túmulo de G. H. Waters, avô de Roger Waters

Hoje, Roger Waters é um senhor. Pai e avô. De cabelos brancos, rosto marcado pelo tempo e muitos milhões em sua conta bancária. Mas ainda carrega a carta consigo. Ainda chora a morte de um pai que não conheceu. e este é o prólogo de sua semi autobiografia musical. Uma obra que atinge 3 esferas da arte: música, teatro e cinema. Uma ópera rock com todos os elementos dramáticos de um Mozart ou Puccini.
Roger Waters

Um Muro à Beira do Abismo

O Pink Floyd já era uma banda calejada no final dos anos 70. Sofreu um grande revés logo no início da carreira quando um dos seus fundadores e maiores mentes sucumbiu à loucura e ao vício em LSD. Syd Barret foi "convidado a sair" do Floyd depois de faltar shows, tocar com instrumento desafinado, tocar uma única nota durante todo um concerto, entre outras peripécias. David Gilmour foi chamado para ocupar a vaga do "diamante louco".
Syd Barret


E o Floyd prosperou. Sua obra Dark Side Of The Moon é um dos álbuns mais aclamados da história do Rock.tocavam em estádios lotados, com os mais caros efeitos de luz, cor e som. A banda elevou a experiencia musical a um nível de transcendentalidade, inspirados pelos Ragas hindus e a música de Ravi Shankhar.
Dark Side Of The Moon

Da esquerda para a direita, Richard Wright, Roger Waters, Nick Mason e David Gilmour


Mas 10 discos depois a banda se encontrava em um beco sem saída. Gilmour e Waters discordavam em quase tudo. Richard Wright havia sido demitido da banda que ajudou a construir, e depois recontratado como músico de apoio. Waters era tido como um ditador na banda, da mesma forma que acusa seus colegas de impedirem que ele cantasse por achá-lo muito desafinado. 

Financeiramente, a banda também não ia bem. Problemas com a Receita Federal e com contratos empresariais e uma série de erros gerenciais arrastaram a banda para uma situação desesperadora. Eles precisavam fazer dinheiro. Muito dinheiro. E de preferência, fora da Inglaterra. Isso obrigaria a banda a arrumar as malas com suas famílias e deixarem o Reino Unido, passando por uma experiência nômade, nas palavras de Gilmour.

O temperamento de Waters começava a piorar. Explosões de fúria aconteciam em shows e no estúdio. Seu casamento fracassado contribuía para o problema. Desde cuspe na cara de um fã durante um show da turnê In The Flesh até um golpe de caratê errado contra um empresário, que resultou num ferimento no pé, eram as atitudes de Waters mais difíceis.

Porém, destes eventos surgiram a centelha do The Wall. No caminho para o hospital, Roger, alguns amigos e um psiquiatra conversavam e Waters teria dito que imaginava criando um muro entre ele e o público. EUREKA! Nascia o embrião da obra prima de Waters.


Bibliografia:

Pink Floyd: Behind The Waal. DVD. Dirigido por Bob Smeaton. 2000

BLAKE, Mark. Nos Bastidores do Pink Floyd. Tradução: Alexandre Callari. São Paulo: Évora, 2012






terça-feira, 14 de julho de 2020

O Bom E Velho Rock And Roll

Artigo publicado originalmente em 04 de outubro de 2014
no blog  http://acordesrecife.blogspot.com.br/
Texto de Amanda Pontual

Rock and roll é o gênero musical nascido entre o final da década de 1940 e primórdios dos anos 1950. Nascido nos subúrbios americanos, descendente do rhythm and blues e country music. O popular R&B, febre entre os anos 30 e 40, havia perdido espaço para as big bands, cujo mercado abrigava mais artistas brancos (MÁXIMO, 2003, p. 85). A reação viria com uma reinvenção do gênero, que o tornasse mais comercial para o grande público.



"O modo de consegui-lo foi separar do R&B o elemento blues - de cujos cultores se exigia certo jeito, certa bossa, certo atavismo fundamentalmente negro e, como tal, intransferível - e deixar para o jovem branco o elemento rhythm, mais assimilável, ao alcance de todos. Assim, sem deixar de existir, o R&B gerou duas vertentes, uma inspirada no blues dos negros, mais tarde denominada soul, e a outra apoiada no rhythm que os brancos eram capazes de entender, gostar, tocar e adotar: o rock'n roll." (MÁXIMO, 2003, p.86)

Embora o rock'n roll se  infiltre na juventude branca norte-americana, não foi sem resistência que o mesmo se impôs. Tido como demoníaco, o rock foi perseguido em primeiras instâncias. Mesmo com grandes expoentes brancos levantando a sua bandeira. Lembremos que o EUA tem um grande histórico de segregação racial, que gerou uma espécie de guerra civil entre 1940 e 1965, ano que se institui o direito de voto dos afro-americanos. E a música, historicamente, tem um forte papel social e político. Deixar a música negra se infiltrar nas casas dos brancos era um ato político e também de relevância social, que precisava ser combatido pelas classes conservadoras.

Uma importante característica da formação básica do rock é o seu instrumental. Diferentemente das Big bands, que necessitam de muitos instrumentistas e trazem o peso dos metais em sua formação quase totalmente acústica, o rock é plugado, utiliza-se de instrumentos elétricos e distorções. Não é necessário mais do que uma guitarra, um baixo e uma bateria. Muito embora o rock posteriormente ampliou e muito este universo sonoro.

Os primórdios da guitarra elétrica vem da década de 1920 e 1930. Porém as guitarras de madeira maciça mais semelhantes com as que encontramos hj, se popularizaram por volta da década de 1940 (http://mundoestranho.abril.com.br/materia/quem-inventou-a-guitarra-eletrica). Nas primeiras formações, o trio de rock trazia a guitarra elétrica, o baixo acústico e a bateria. Porém o baixo acústico gerava um certo problema de locomoção, devido ao seu tamanho e fragilidade. Em 51, Leo Fender criou o baixo elétrico, ou Fender Bass. Criado para substituir o contrabaixo acústico, de difícil transporte. (http://pt.m.wikipedia.org/wiki/Baixo_el%C3%A9trico)

Em 1951, a lendária gravadora Sun Records já trazia um esboço do que seria conhecido mais tarde como rock'n roll. O lendário produtor e dono do selo, Sam Phillips, já havia feito registros de artistas de blues, tal como B.B. King. E foi da Sun Records a que hoje é conhecida como a primeira gravação de rock. "Rocket 88" de Jackie Brenston e  Delta cats (banda de Ike Turner, futuro marido de Tina Turner).

A mesma Sun Records seria a responsável por apresentar ao mercado aquele que seria mais tarde conhecido como o Rei do Rock'n Roll. Elvis Presley, um jovem caipira nascido em Tupelo, que se mudou para a cidade de Memphis com seus pais. Tendo crescido em meio a música dos negros, o R&B e o gospel, além da country Music, Elvis já dava seus passos na música desde os primórdios da sua adolescência. Mas a chance de gravar um compacto se deu no verão de 1953. A gravadora realizava gravações de acetatos pelo preço de US$ 8,25. Elvis resolveu gravar um compacto para presentear a sua mãe (JORGENSEN, 2010, p. 24).

Elvis Presley


A princípio, gravou apenas baladas como "My Hapiness". Esperou por um contato futuro da gravadora que não aconteceu. Voltou em janeiro de 1954 para gravar mais um compacto. Meses depois, em Julho de 1959, Sam Phillips decidiu investir naquele rapaz que até então cantava apenas baladas. Juntou-o com o guitarrista Scotty Moore e o baixista Bill Black e gravaram 4 musicas, dentre elas "That's All Right Mama", que definiria o som adotado pelo rockeiro topetudo Elvis (JORGENSEN, 2010, p. 27).

Elvis ditou moda, não apenas pela sua característica voz de barítono e seu estiloso topete coberto de brilhantina e suas grandes costeletas. Ditou moda e transgrediu pela forma que se mexia no palco, com suas pernas trêmulas e seu gingado de quadris. Foi apelidado de "Elvis, The Pelvis". Sua sensualidade no palco enlouquecia as garotas, que gritavam e desmaiavam com o seu rebolado. Por esse motivo, foi censurado nas tv's americanas, que apenas estavam autorizadas a filmarem o astro da cintura para cima.

Mais tarde, o contrato de Elvis passaria para as mãos da RCA Records. Porém a Sun ainda teria muito o que contribuir para o mundo do Rock, com a inclusão em seu selo de artistas como Jerry Lee Lewis, Carl Perkins (compositor de Blue Suede Shoes) e o "cantor das penitenciárias" Johnny Cash. Jerry Lee se destacava por sua personalidade explosiva e por se apresentar ao piano, enquanto boa parte dos vocalistas de rock preferia o uso das guitarras.
Jerry Lee Lewis


Grandes expoentes do mercado de rock dos anos 50, Chuck Berry, Chubby Checker e Little Richard são talvez alguns dos autênticos "inventores" do então novo estilo musical. Assim como Jerry Lee, Little Richard se destacava por se apresentar ao piano, além de manter uma aparência extravagante. O guitarrista Chuck Berry é hoje conhecido como "o pai do rock'n roll" (www.chuckberry.com). Por se tratarem de artistas negros, não obtinham muito espaço nas mídias televisivas, embora aos poucos a música quebrou esta barreira.

Chuck Berry

Little Richard

Antes mesmo de Chuck Berry e Little Richard, uma mulher negra, de posse de sua guitarra elétrica, já fazia sucesso nas rádios uma década antes. Era Rosetta Nubin, também conhecida como Sister Rosetta Tharpe. Grande influenciadora de artistas como B.B. King, Chuck Berry e até mesmo o coroado Rei do Rock Elvis Presley, que dizem não perdia um programa seu nas rádios.

Sister Rosetta Tharpe


Em 3 de fevereiro de 1959, um pequeno avião com jovens estrelas do rock sofreu um acidente, matando todos os integrantes. Dentro do avião estavam Buddy Holly, J. P. "The Big Booper" Richardson e Ritchie Vallens. Charles Hardin Holley, ou Buddy Holly, era um cantor, compositor e guitarrista que vinha alçando grandes voos no mercado musical. Tinha 22 quando seu avião caiu em um milharal. Ritchie Valens, conhecido pela balada Donna e pelo hit La Bamba, tinha 17 anos quando o trágico acidente ocorreu. O evento ficou conhecido como O Dia em que a Música Morreu, e foi imortalizado na canção de Don McClean "American Pie".
Buddy Holly

Ritchie Vallens



Nos anos 60, juntamente com o grande movimento dos direitos civis, surge em Detroit a gravadora Motown Records, cujo dono era Berry Gordy Jr. A gravadora foi responsável por lançar uma série de artistas negros de grande porte como Diana Ross e as Supremes, Stevie Wonder e Michael Jackson e os Jackson 5.
Jackson Five
Diana Ross and The Supremes

Stevie Wonder




Na década de 60 também ocorre a "primeira invasão britânica". Com a difusão do rock no mundo, a Inglaterra se tornou um dos grandes  produtores do gênero, em especial com o surgimento dos Beatles.

Os 4 rapazes de Liverpool são responsáveis pela difusão do estilo iê-iê-iê que deu origem no Brasil ao movimento da Jovem Guarda. Os Beatles permaneceram na ativa até 1970, e são responsáveis pelos álbuns mais icônicos de todos os tempo.

The Beatles

Obstinados, os Beatles possuíam um grande empresário que soube colocar os rapazes na linha de frente da música mundial. Seu nome era Brian Epstein. Também contaram com os arranjos do compositor e maestro George Martin, que tornou ainda mais icônica a produção musical do grupo.
Os Beatles tinham uma excessiva agenda de shows entre os anos de 1962/63 e se lançaram em turnê pelos EUA em 1964.

34 dias de turnê, com 24 shows e estava instaurada a Beatlemania nos EUA. Exaustos da rotina de shows, os Beatles decidiram entre 1965/66 dedicar-se mais aos estúdios do que às apresentações ao vivo. Alguns dos maiores legados de álbuns da história do rock foram produzidos nesta fase, como Sargent Peppers Lonely Hearts Club Band e o White Álbum.

Era de se esperar que após anos de convivência intensa, a parceria musical ficasse desgastada. Com Let It Be de 1970, encerra-se a banda, porém o mito perdura até os dias atuais. Cada integrante seguiu carreira solo. (THOMAS, 2010, p. 7)

Nos EUA a banda concorrente dos Beatles eram os Beach Boys. Comandada pelo gênio Brian Wilson, tendo seus irmãos e primos como formadores da banda, se destacavam pela temática de praia e surf e os vocais elaborados e uso de falsete. O álbum Pet Sounds é o destaque desse grupo.
Beach Boys - Capa do Pet Sounds


Na segunda metade da década de 60, experiências com o ácido lisergico, a droga LSD, trazem o psicodélico para a música. Outras drogas como a canabis, a cocaína e a heroína se tornam cada vez mais presentes no universo do rock.

O uso de LSD foi amplamente difundido por artistas como os Beatles. Também foi responsável por agravar problemas mentais, como aconteceu no caso de Brian Wilson dos Beach Boys e Syd Barret do Pink Floyd, ambos portadores de esquizofrenia.

Influenciados pela luta contra a violência, contra as guerras e exaltando os problemas das "pessoas simples" surge na metade dos anos 60 o movimento Folk Rock. Dentre alguns dos artistas desse movimento, destacam-se Bob Dylan, Joni Mitchell, Joan Baez e Peter, Paul and Mary.
Joan Baez e Bob Dylan

Joni Mitchell



Entre 15 e 18 de agosto de 1969 acontece o festival de woodstock. Um festival pela música, paz e que difundiu o movimento hippie do amor livre. Sexo, drogas e rock and roll são as palavras de ordem.

Os anos foram se passando e o rock foi sofrendo modificações e experimentações. O rock progressivo se difundiu na década de 70, misturando elementos da música erudita com elementos do rock clássico. Os concertos se tornaram mega shows. Alguns com características de composições sinfônicas.

Nasce a ópera rock, narrativa musical em forma de álbum que gerou grandes concertos ao vivo e filmes de sucesso. Entre essas obras, destacamos Tommy do grupo The Who, lançado como álbum em 1969 e como obra cinematográfica em 1975, e The Wall, mega projeto do Pink Floyd lançado em 1979 com versão para o cinema de 1982.
Capa da ópera rock Tommy
Capa do filme The Wall



Entre os anos 1970 e 1980, surgem o Hard Rock e o Heavy Metal, algumas das vertentes mais agressivas do rock. O punk rock surge também em 80 com bandas como Sex Pistols e The Clash, e tinha como intuito fazer uma música simples na questão harmônica, porém barulhenta e política.
The Clash


Outros vários gêneros foram se formando ao longo dos anos, como o Grunge, o Indie, Nu Metal, Metal Melódico, Gothic Metal e tantos outros.

A verdade é que ninguém mais fica imune ao impacto causado pelo rock no mundo. O rock não morre, se renova. Tal qual a Hidra de Lerna da mitologia grega, ao tentar se cortar uma cabeça, nascem duas em seu lugar. E assim, passam anos e décadas. Mas o bom e velho Rock and Roll continua a existir e arrastar multidões mundo afora.

Parceiro: Casa da Musika

Referências:

JORGENSEN, Ernest. Elvis Presley: a vida na música: as sessões de gravações completas; tradução Estúdio Candombá. São Paulo, Larrousse do Brasil, 2010.

MÁXIMO, João. A Música do Cinema: Os 100 primeiros anos Vol. 2. Rio de Janeiro, Rocco, 2003.

THOMAS, Garret. Beatles: a história ilustrada. Tradução Heitor Pitombo. São Paulo, Editora Escala, 2010.

http://pt.m.wikipedia.org/wiki/Baixo_el%C3%A9trico

http://mundoestranho.abril.com.br/materia/quem-inventou-a-guitarra-eletrica

www.chuckberry.com

http://pt.m.wikipedia.org/wiki/Rock_and_roll

https://pt.wikipedia.org/wiki/Sister_Rosetta_Tharpe